UMA ESQUISITA VANTAGEM COMPARATIVA
A FINALIDADE DOS ACORDOS COMERCIAIS. UM CASO CONCRETO
Vantagem Comparativa é o princípio econômico orientador das políticas de livre comércio, e.g., a China produz bens de capital exportáveis a custo adequado, necessários ao Brasil, que tem os minérios e produtos siderúrgicos crus necessários à China, que não os tem, tem-nos insuficientes ou a custos inadequados. A China vender bens de capital ao Brasil, e este exportar-lhe minério ou ferro cru, é comparativamente vantajoso para ambos os países, sempre num contexto compensatório e de equilíbrio das respectivas balanças, sem desvantagem para a Economia mais frágil. É a consagração da regra só é bom quando é bom para ambas as partes ou para todas as partes.
O princípio da vantagem comparativa se desvia nas zonas de influência surgidas em função do poder econômico/político dominante; o comércio daí decorrente, longe de ser livre, mais serve às economias desenvolvidas na busca de mercados para colocação dos excedentes de produção da capacidade instalada superior às suas necessidades e alargamento de sua capacidade de emprego, do que às Economias menores, canibalizadas pelas Economias mais fortes com prejuízo para a sua produção/nível de emprego, e risco, mesmo, a longo prazo, de sua própria independência, tendendo a transformar os países que embarcam nessa aventura em colônias culturais que geralmente se tornam colônias comerciais. O princípio da vantagem comparativa só labora em pleno vigor quando os interesses são recíprocos, caso a caso, especialmente entre Economias desenvolvidas. Os elementos norteadores são o respeito e os custos. Adequados.
Em tema do noticiado Acordo de Livre Comércio entre a União Europeia e o Mercosul, há de se observar que não se tem um Acordo formal, mas apenas um “rascunho” inconcluso dependente da definição de complexas questões constitucionais a serem apreciadas pelos Congressos e Parlamentos Sul-Americanos e Europeu. O texto existente está mais para uma declaração de princípios do que para um documento com o peso necessário para definir o futuro dos países do Mercosul, Brasil e Argentina já com suas Economias travadas e altamente comprometidas, em especial a Argentina, que só precisa de um empurrãozinho final do seu atual governo para desmantelar-se irremediavelmente, o Brasil vivendo de generalidades mal explicadas em uma situação virtual sob a qual a realidade é cambiante, obscura, e na qual não se tem certeza de nada, tudo traduzido em reticências, de concreto somente, na hipótese em escala mais ampla e explícita, a perspectiva de que a nossa indústria, que já participou de aproximados 30% (trinta por cento) do PIB, hoje não chega a 1/3 disso, com chances reais de, avaliando-se com a gravidade necessária seu estado presente e o que lhe está sendo preparado, ir de vez para o buraco, com todas as consequências a que tem direito.
Esse Acordo de Livre Comércio com a União Europeia, um capítulo cinzento da história econômica sul-americana, começou em 1999, só vindo em 2004 uma proposta concreta de redução de tarifas, a partir de quando tudo parou, recomeçando nos governos Temer e Macri, os dois “liberais” a quem parece não importar o futuro dos seus países e das suas gentes. As coisas chegaram ao estágio atual pela ação da Comissão Europeia, já de saída, com a missão de salvar a Economia do continente ao mesmo tempo em que nada lhe importa o que sucederá com as Economias fora do âmbito da UE. No Brasil, fala-se ilusoriamente de números da ordem de 125 (cento e vinte e cinco) bilhões de Reais de aumento do PIB em 15 (quinze) anos, valor que percentualmente expresso não chega a 2% (dois por cento) do PIB de 2018. Em 15 anos! De outro modo, a CNI prevê a criação de 778 (setecentos e setenta e oito) mil empregos em 10 (dez) anos; HOJE, temos 13,5 (treze e meio) milhões de desempregados.
Não há vantagem comparativa. Se vier a ser concluído, o “Acordo” eliminará a quase totalidade das tarifas sobre as exportações europeias para o Mercosul, incluindo bens de capital, autopeças, veículos, produtos químicos e farmacêuticos, tecidos, calçados, vinhos, doces, queijos, roupas e outros produtos, enquanto os produtos exportados pelo Mercosul deverão atender os padrões europeus de segurança e, obviamente, de qualidade. Sendo o Brasil um país basicamente exportador de commodities, com baixíssimos índices de qualidade em seus produtos industrializados, a conclusão lógica é a de que nossas exportações serão no mínimo ridículas em face das importações, é dizer, continuaremos meros exportadores de alimentos e minérios.
Teme-se que toda a movimentação em torno desse assunto nada mais seja do que a necessidade de demonstrar que o Brasil de hoje faz reformas liberalizantes, sem deixar expresso que tais reformas por certo comprometerão de vez o seu futuro e de sua gente. Nossos empregos minguarão ainda mais.
Quantos países estão em condições de ratificar esse “Acordo”? Na prática, nenhum. Há uma grave polarização no ar, o econômico, de um lado, o político, de outro. O Parlamento Europeu não tem qualquer interesse neste, somente naquele, o econômico, enquanto os Congressos do Mercosul terão de ocupar-se severamente dos dois, inextricáveis nas circunstâncias. Considerando com a seriedade necessária o Acordo de Paris e suas implicações, a própria França terá condições de ratificar de pronto esse Acordo de Livre Comércio? As dúvidas são muitas; há posições intransigentes, na verdade autoritárias, que não estão na Europa, nem na América do Sul, e isso tem tudo a ver com o conjunto dos acordos globais e semi-globais, com o futuro da saúde do planeta. Em todos os sentidos.
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